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Coronel Emir Larangeira “POR QUE DIGO NÃO ÀS UPPS?”

A Doutrina do Direito Administrativo é muito cautelosa ao formular um conceito de ordem pública no contexto da convivência social. Renomados administrativistas situam-se numa posição de ceticismo ante alguns que não traduzem a realidade material (o ser da convivência social). A maioria, na verdade, prefere alegar que qualquer conceito seria “movediço”, imprimindo à ordem pública certa subjetividade, assim como sua “garantia” (a “segurança pública”) também se obriga à mesma condição subjetiva, já que se trata de percepção multifacetada e multivariada. Enfim, são situações relativas; não são concretas, já que a impressão de cada um dos seres humanos difere entre si e se mantém no âmbito do “estado de espírito”, ou seja, cada um desses seres guarda em si uma sensação de segurança ou insegurança diversa de quem está ao seu lado, materializando-se esta atitude (não observável) apenas quando se configura um comportamento (observável), segundo conceitos correntes da Psicologia Social.

O saudoso mestre Diogo de Figueiredo Moreira Neto, num exercício intelectual formidável, escudado na Teoria de Sistemas, arriscou-se a conceituar a ordem pública, o que não é o mesmo que a definir, uma impossibilidade consensual entre todos os colegas dele. Vale aqui citar o conceito e seus cautelosos vocábulos: “Ordem Pública, objeto da segurança pública, é a situação de convivência pacífica e harmoniosa da população, fundada nos princípios éticos vigentes na sociedade”.

Como se pode depreender, se a ordem pública é objeto da segurança pública, esta é o sujeito da ação, sua garantia; quanto à “situação de convivência pacífica e harmoniosa da população” nada mais inespecífico e surreal. Ora, as Polícias Militares são polícias ostensivas de preservação da ordem pública”, situando-se no âmbito da polícia administrativa como elemento físico representativo e instrumental daquela “garantia”. Por isso, com a mesma cautela, presume-se que no ambiente social haja “riscos” à ordem pública (quais?) a demandar sua eliminação da convivência social pela presença ostensiva da PM. Ora, como se pode concretamente concluir por esta “situação” individual ou comunitária (“segurança individual” + “segurança comunitária = “segurança pública”)? Haja subjetividade!…

Mas é esta a missão precípua da PM, que supostamente inibirá, – por sua presença elevada ao máximo da frequência no ambiente social, – inibirá a oportunidade de o delinquente, até aqui não identificado como tal, praticar algum delito contra um indivíduo ou grupo de indivíduos. Deduz-se desta celeuma que o PM estaria postado num ambiente como se o invisível delinquente ainda nem existisse, e, em função de sua presença ostensiva, ele, o bandido, se comportasse de maneira a não consumar o delitos. Enfim, nada mais “movediço”….

Movediça ou não, a ordem pública é papel constitucional das Polícias Militares, à qual cabe o “policiamento ostensivo de preservação da ordem pública”. Daí serem as PPMM polícias administrativas de segurança pública, com a missão precípua de inibir a oportunidade de delinquentes praticarem algum delito. Por isso a PM deve pelo menos “fingir” que é onipresente, ressalvados os casos em que o PM por acaso identifica algum delinquente, ou por ser ele contumaz e já alguma vez atalhado, ou o PM simplesmente desconfia de todo mundo, prática danosa e ilegal, que costuma incentivar blitze para atalhar o cidadão ordeiro na presunção de que ele seria um suposto delinquente. Eta profissão difícil para quem costuma ser conceitual e pensar no assunto, e fácil para quem só se contenta com o “como fazer” em vez de procurar saber “por que fazer”.

Vistos os conceitos doutrinários, deveras subjetivos e espinhosos, deve-se agora pensar na ação, claro que com o foco na “onipresença” (quase divina) no ambiente, o que poderia ser feito com volumosos efetivos e viaturas caracterizadas circulando sistemática e aleatoriamente num dado ambiente, na presunção de que, em sendo vistas pelo transeunte, lhe garanta uma sensação de segurança, e, em sendo vista pelo delinquente, lhe garanta uma possibilidade de ser preso ao tentar delinquir. Pelo sim, pelo não, cabe à PM planejar a tal “onipresença” com máxima frequência, ou optar uma visão geral e menos onerosa (câmeras instaladas no ambiente), tais como no panoptismo de Jeremy Benthan. Ou seja, esbanjando tecnologia de observação geral, do modo como vi no centro de Tóquio (Guinza Daiei) em 1989.

O que não pode é substituir um PM de carne e osso por um prédio caracterizado, com meia dúzia de PMs dentro, e bandidos aos montões do lado de fora, e dizer que isto é “prevenção pela presença” ou “polícia de proximidade”, algo que afronta qualquer inteligência mediana e está mais para aberração.  Isto é, enfim, uma UPP…

Há na cidade do Rio de Janeiro, que conta mais de mil comunidades carentes, 39 protótipos de UPP, sem que se garanta qualquer possibilidade de prevenção pela presença e menos ainda repressão, eis que os ambientes em questão estão apinhados de traficantes armados para a guerra com fuzis AK-47 e semelhantes. Num contexto ainda conceitual de “seletividade do uso da força”, os PMs das UPPs seriam formigas e os traficantes, elefantes. Ou então uma pequena barata a conter a fúria de cem chinelas. Isto é, enfim uma UPP…

Ocorre que as 39 UPPs acolhem atualmente entre 9.000  a 10.000 PMs, todos animados por gratificações que os patrulheiros não sonham receber. Por isso, digo não às UPPs, pois esse efetivo serviria para complementar diversos batalhões, para começo de conversa, e também evitaria ferir a recomendação constitucional da igualdade entre os executam tarefas idênticas, pelo menos supostamente. E novamente por isso digo não às UPPs, sem embargo do valor individual dos PMs (praças), executores de tarefas práticas (o “como fazer”), que vão para onde mandam e cumprem como podem a missão, mesmo que seja contrária aos conceitos doutrinários, que devem ser entendidos e consagrados pelos que efetivamente deveriam pensar antes de agir (o por que fazer). Eis por que, em síntese, digo não às UPPs!

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